12.4.12

Expandindo o círculo

No post anterior, falei sobre o projeto que Fábio Fernandes está capitaneando com a revista (e não editora, como a chamei) The Future Fire para uma coletânea internacional a respeito do Colonialismo, a partir do ponto de vista dos povos oprimidos. Agora vamos ter a oportunidade de conhecer em mais detalhes este e outros projetos dessa parceria na entrevista a seguir, com o próprio brasileiro, nosso conhecido, e com Djibril al-Ayad, o editor dessa engajada publicação.


Quais os objetivos e como está estruturada sua revista?

Djibril al-Ayad: The Future Fire é uma revista de ficção especulativa social e política, o que significa que estamos interessados em histórias *ao mesmo tempo* contem uma história bem, com uma bela linguagem e bastante ação ou uma trama cativante, *e* tenham uma consciência social explícita. Temos um foco particularmente voltado para histórias com conteúdo feminista, queer, racial ou ambiental, pós-apocalíptico ou de distopia política e assim por diante. Tentamos nos manter envolvidos com diversas comunidades online nessas áreas: os seminários #FeministSF no Twitter, o grupo de defesa por uma ficção especulativa queer The Outer Alliance, etc.

A revista é pequena e não foi criada para dar lucro. Temos uma equipe editorial pequena e informal, com membros que mudam periodicamente, e eu sou o editor-geral desde a fundação do zine em 2005. A TFF publica uma media de quarto edições online por ano, que estão disponíveis para leitura online free ou em PDF baixável ou formatos de -book.

Que outros projetos já foram desenvolvidos e ainda estão em aberto pela TFF?

DA: Além do lançamento periódico constante da revista gratuita, estamos atualmente lendo histórias para outra antologia temática, que será publicada em julho, intitulada Outlaw Bodes [Corpos Fora-da-Lei], que pode combinar temas cyberpunk, queer, trans e deficiências, bem como uma série de outros temas de políticas do corpo. Estou ansioso para ver como será a experiência de publicar essas antologias (incluindo a versões de edições limitadas de ebook e impressas para venda), e espero poder fazer mais disso no futuro.

 No caso da coletânea sobre Colonialismo, como se deu a aproximação entre Fábio Fernandes e a revista? De quem partiu a ideia para essa antologia temática?

DA: Esta pergunta na verdade é mais para o Fábio, que respondeu um anúncio que publicamos no ano passado solicitando temas para uma antologia, e enviou um dos dois tópicos que selecionamos (além do de Outlaw Bodies que acabei de mencionar). O tema de colonialismo era bem a nossa área de atividade, era uma proposta ponderosa, e Fábio estava obviamente muito entusiasmado e era bem qualificado para organizar e co-editar uma antologia sobre esse tema. Ele pode nos contar mais de onde veio essa ideia.

Fábio Fernandes: Essa ideia já estava na minha cabeça havia algum tempo, e bastou ler o anúncio da TFF para que a semente germinasse. O que eu sempre quis, desde o tempo em que só escrevia FC em português, era reunir vários nomes de qualidade para fazer um trabalho representativo da cultura brasileira, latina e ir aumentando o círculo. O anúncio me fez ver que havia chegado a hora de expandir esse círculo de uma vez. Para uma revista em inglês, não faz sentido pensar pequeno: é o mundo inteiro ou nada. Então vamos apostar no mundo. Vamos falar de colonialismo do ponto de vista do oprimido, ou no mínimo de quem teve ou tem a experiência cotidiana de viver num país que não vive dentro da esfera econômica anglo-americana, mas sofreu ou ainda sofre forte influência de sua cultura.

O projeto que está levantando recursos em sistema de crowdfunding já conta com o apoio de personalidades da FC mundial como o inglês China Miéville, o grande nome da weird fiction mundial, entre outros. Vocês esperam mobilizar também colaboradores com esse nível de experiência entre os autores a enviar textos?

FF: Certamente. Não esperamos que o próprio China colabore, pois um autor do calibre dele é extremamente ocupado (mas se ele pudesse, eu não recusaria, hehehe). Mas alguns autores já começam a se oferecer de forma muito generosa para colaborar. Paul Graham Raven, editor-chefe da Futurismic.com, se ofereceu para fazer o copy da edição, o que nos deixou maravilhados, pois ele é competentíssimo e muito ocupado. Temos também recebido e-mails de autores para tirar dúvidas sobre que tipos de histórias estaríamos procurando, mas isso ainda vamos explicar melhor daqui a pouco tempo em nosso call for submissions, e não temos dúvida de que muita gente boa (conhecida ou não) vai aparecer com ótimas histórias.

Como vocês avaliam a participação do mundo não-anglófono na ficção científica produzida hoje em dia? Em termos de qualidade, quantidade, relevância e consumo, há motivos para se comemorar ou ainda temos muito caminho a percorrer?

FF: Eu vejo essa participação com muito otimismo. O continente africano tem começado a aparecer cada vez mais com nomes como Jonathan Dotse e Lauren Beukes e projetos como a revista Jungle Jim [Jim das Selvas], cujo próprio nome é uma brincadeira e uma crítica ao imperialismo. O oriente, como China, Japão e Filipinas especialmente, sempre produziu muito em termos de quantidade, embora o mercado seja, assim como o brasileiro, mais fechado (o caso do Japão é diferente por causa da invasão dos animes e dos mangás, e nos EUA a editoria Haikasoru começou a traduzir, nos últimos anos, muitos livros de FC bem interessantes). Mas ainda há muito que avançar: nós brasileiros, e a América Latina em geral, somos muito isolacionistas, eu diria até mesmo elitistas, e está mais do que na hora de isso acabar. Eu gostaria muito de ver contos brasileiros e de outros países da América Latina entre as submissões desta edição.

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